Silhuetas de estegossauros macho (em cima) e fêmea (em baixo) SAITTA ET AL.
Evan Saitta ao pé de uma placa óssea de estegossauro que foi analisada por tomografia computadorizada na Clínica Billings, um hostpital do Montana CLÍNICA BILLINGS, MONTANA (EUA)
Os dois tipos de placas ósseas: larga e arredondada (à esquerda), estreita e pontiaguda (à direita)
SAITTA ET AL.
Em muitas espécies actuais, dos pavões aos veados, dos touros aos humanos, o sexo dos adultos é visível nos seus atributos físicos. Agora, pela primeira vez, há provas concretas de “dimorfismo sexual” também nos dinossauros.
É muito provável que os estegossauros machos e fêmeas se tenham distinguido pela forma e o tamanho das suas placas ósseas dorsais, conclui um estudo publicado na quarta-feira na revista online de acesso livre PLoS One.
A silhueta dos estegossauros – grandes dinossauros herbívoros que viveram há cerca de 150 milhões de anos e cujos ossos fossilizados foram encontrados não só nos EUA, mas também em Portugal – é sobretudo reconhecível pelas duas filas de placas ósseas distribuídas ao longo da sua coluna vertebral. E já se sabia que algumas dessas placas eram largas e arredondadas, enquanto outras eram mais estreitas, alongadas e pontiagudas. Mais: o tamanho das placas largas chegava a ser quase 45% maior do que a das estreitas.
Já existiam também diversas explicações possíveis para esta variabilidade da forma das placas. Por exemplo, talvez tivesse havido várias espécies distintas de estogossauros – ou talvez se tratasse de dois estádios de crescimento dos estegossauros de uma mesma espécie. Ou talvez ainda, ambos os sexos possuíssem placas dos dois tipos.
Mas agora, tendo escavado, ao longo de seis Verões, os restos fósseis encontrados num autêntico “cemitério” de estegossauros (Stegosauros mjosi) no Montana, EUA, Evan Saitta, jovem estudante da Universidade de Bristol, no Reino Unido, pôde passar minuciosamente em revista e testar as diversas hipóteses. Também analisou fósseis de estegossauro anteriormente descobertos.
E assim, conclui – não com certeza absoluta, mas ao menos com uma boa dose dela – que, ao que tudo indica, as placas ósseas largas pertenciam a estegossauros machos e as estreitas a estegossauros fêmeas.
“Evan fez esta descoberta quando estava a completar o seu mestrado na Universidade de Princeton [EUA]”, diz Michael Benton, do Departamento de Paleobiologia da Universidade de Bristol, em comunicado daquela instituição britânica. “É impressionante quando um estudante a nível universitário faz uma descoberta de uma tal importância”.
Este tipo de diferenças anatómicas é comum nos animais actuais – basta pensar na juba dos leões machos ou nas hastes dos veados. Porém, lê-se no mesmo documento, é surpreendentemente difícil de determinar nas espécies extintas.
Com um rigor igualmente surpreendente, Saitta “disseca” no seu artigo, uma após a outra, as várias explicações alternativas, descartando-as com observações e experiências. A primeira hipótese seria que um mesmo estegossauro tivesse os dois tipos de placas. Mas isso não parece possível, responde o autor. Por um lado, escreve, apesar de as placas estarem misturadas no local da escavação, “ambas as formas de placas representam todas as regiões do corpo, da cabeça à cauda” dos animais. E por outro, “todos os espécimes isolados de estegossauro apenas possuem um tipo de placa.”
A segunda explicação – a existência de duas espécies diferentes – e examinada a seguir. Mas para Saitta, se assim fosse, teria sido previsível encontrar, “na mistura de ossos”, outras diferenças anatómicas ao nível do crânio ou das extremidades, por exemplo – o que, no mínimo, fragilizaria uma tal conclusão. Ora, não existem outras diferenças, a não ser ao nível das placas, entre os espécimes.
Para invalidar, em terceiro lugar, a possibilidade de as placas largas serem “adultas” e as estreita “juvenis”, Saitta recorreu à técnica de tomografia computadorizada e à microscopia, demonstrando que ambos os tipos de placas pertenciam a animais adultos, cujo tecido ósseo já tinha completado o seu crescimento.
“Com todas as outras hipóteses aparentemente excluídas”, escreve então o cientista, “o dimorfismo sexual representa a explicação mais provável da variação observada nas placas ósseas.”
Todavia, não é possível dizer qual terá sido o tipo de placa característico de cada sexo, uma vez que não foi descoberto nenhum tecido ósseo que permitisse determinar o sexo de algum dos espécimes – “nem ovos dentro da cavidade corporal” que assinalassem tratar-se de uma fêmea.
Mas isso não impede Saitta, por analogia com espécies actuais, de especular que as placas maiores pertenciam aos machos e as mais pequenas às fêmeas de estegossauro. “Na medida em que os machos investem mais na ornamentação corporal, as placas mais largas e grandes eram provavelmente atributos dos machos”, disse, citado num comunicado da PLos One. Quanto às placas longas e estreitas, “poderão ter funcionado como picos que as fêmeas usavam para afastar os predadores”. A descoberta poderá assim permitir perceber muito melhor o comportamento destes dinossauros.
O dimorfismo sexual também poderá ter existido noutros dinossauros, nomeadamente nos triceratops, ao nível dos seus característicos cornos. “No futuro, seria possível estudar a possibilidade de que os espécimes de triceratops dotados de cornos [até aqui considerados] ‘juvenis’ serem [na realidade] animais adultos e sexualmente maduros”, conclui Saitta.
fonte: Público
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