domingo, 21 de novembro de 2010

Faraos Negros


Egipto foi, ao longo de sua história, alvo de diferentes processos de unificação e invasão. Ao contrário do que usualmente estudamos, essas invasões ocorreram durante outros momentos anteriores à dominação dos romanos no século I ou das nações europeias no século XIX. Dessa maneira, as crises e hegemonias no interior da civilização egípcia é um assunto ainda pouco explorado pelos estudos historiográficos.

Na região sul do Rio Nilo, actual Sudão, um antigo império formou-se no período em que o Egipto vivia um período de decadência no Médio Império. Entre os séculos XVIII e XVI a.C., os núbios realizaram a expansão de suas fronteiras na região do extremo sul do Rio Nilo. O Egipto, que dependia da exploração de zonas de exploração aurífera próximas ao Império Núbio, sentiam que a ascensão de um vizinho tão poderoso poderia vir a ameaçar a integridade de seus territórios.

Dessa forma, entre os séculos XVI e XIII a.C., o Egipto realizou um processo de invasão e domínio sobre os núbios. Sem adotar uma política muito opressiva, os egípcios trouxeram à civilização núbia vários de seus costumes e hábitos. O que parecia ser um claro processo de aculturação dos egípcios sobre os núbios, veio mais tarde garantir a preservação de traços importantes da civilização egípcia. No final do século VIII a.C., o Egipto estava politicamente fragmentado e sofria o controle dos líbios.

Em 770 a.C., Piye, rei da Núbia, empreendeu uma investida militar que reunificaria politicamente o Egipto. Partindo com tropas para o norte, o exército núbio chegou à cidade egípcia de Tebas. Travando batalhas ao longo de quase um ano, Piye tornou-se o primeiro faraó negro do Egipto. A ascensão de faraós negros no Egipto trouxe à tona a supremacia de uma civilização africana que questionava as ideias dos pensadores e historiadores do século XIX, que colocavam os povos africanos enquanto sinónimo de atraso.

No ano de 715 a.C., Piye faleceu, deixando o trono sob o domínio de seu irmão Shabaka. Ascendendo ao poder, Shabaka assumiu o nome de faraó Pepi II. Entre suas principais acções, Pepi II empreendeu um notório conjunto de obras públicas. A cidade de Tebas, capital do Egipto, e o templo de Luxor ganharam novos projectos. Em Karnak, ordenou a construção de uma estátua em sua homenagem e tratou de construir diques que impedissem a inundação das casas das populações que viviam às margens do Rio Nilo.

Preocupados com o avanço do Império Assírio, que na época viva a ampliação de seus domínios, os núbios formaram um exército que deveria conter a dominação assíria sobre as cidades de Eltekeh e Jerusalém. Apesar de não existirem detalhes mais claros sobre essa batalha, relatos dão conta de que o então rei assírio Senaqueribe recuou suas tropas, dando vitória à aliança militar dos hebreus e núbios. Segundo alguns historiadores, graças à contribuição militar núbia, a civilização judaica usufruiu de um longo período em que consolidou suas principais tradições culturais e religiosas.

Depois desse episódio, houve a consolidação do reinado de Taharqa, filho de Piye. Em seu governo, as vitórias militares garantiram grande estabilidade aos territórios egípcios. Além disso, uma sequência de generosos períodos de chuva deu tranquilidade a toda população por ele controlada. Aproveitando do período de prosperidade, Taharqa realizou a ampliação do templo de Amon. No monte Jebel Barkal, onde acreditava-se ser o local onde o deus Amon haveria nascido, Taharqa ordenou a construção de dois templos aos pés do monte.

Durante seu governo, os assírios afrontaram mais uma vez a dinastia núbia. Sobre o comando do rei Esarhaddon, os assírios tentaram obstruir o entreposto comercial egípcio às margens do Líbano. Confiante na prosperidade de seu reino e na força de seus exércitos, Taharqa enviou tropas incumbidas de aniquilar a acção militar assíria. Oferecendo grande resistência, os assírios venceram a batalha e invadiram o Egipto, em 674 a.C.. Nos anos seguintes os assírios empreenderam novas vitórias que ameaçaram a dinastia dos faraós negros.

As investidas dos militares assírios foram estabelecendo o fim do reinado de Taharqa. Recuado para o sul, o último rei da dinastia núbia se viu obrigado, logo em seguida, a abandonar o Egipto. Depois de perder o controle sobre o Egipto, pouco se sabe a respeito dos últimos dias do rei Taharqa. Seu corpo foi enterrado numa pirâmide em Nuri, às margens do rio Nilo. Com o fim dessa dinastia, a cultura egípcia ainda preservou características provenientes do contacto com esse reino africano.

fonte: Geledés

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