domingo, 17 de outubro de 2010

LHC está a entrar em região nunca antes explorada


O Castor, que faz parte do LHC, foi um dos detectores que teve participação de brasileiros na criação

O projecto do maior instrumento científico já construído, o acelerador de partículas LHC (Large Hadron Collider, ou grande acelerador de particulas) conta com a participação de diversos investigadores brasileiros. Segundo eles, apesar de ainda estar numa fase inicial, o acelerador já teve resultados surpreendentes e está entrando num campo nunca antes investigado na prática.

"É uma região de energia que a gente nunca explorou em laboratório. Nós nunca fizemos esses tipos de reações em condições controladas. E o facto de a gente conseguir fazer isso já é um grande feito, já é uma grande conquista", diz Jun Takahashi, professor do Instituto de Física Gleb Wataghin, da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp).

"Para você ter uma ideia, a gente tem milhões de eventos, milhões de colisões acontecendo, e nós medimos e as fotografamos. E vamos estudando. A medida que aprendemos, publicamos artigos. Então estamos reunindo informações especificas do que está acontecendo nessas colisões, para tentar entender um pouco melhor o que acontece no mais fundamental da matéria. Mas o principal, para nós, foi mesmo a oportunidade de verificar o intenso envolvimento da nossa equipa e oferecer uma experiência única de formação para nossos alunos", afirmou.

Dividido entre seis grandes experiências, o LHC estuda partículas fundamentais dos átomos e ajudará no entendimento do universo. Entre os objectivos, está o de registar pela primeira vez a chamada "partícula de Deus", o bosão de Higgs, um dos componentes do átomo.

"No LHC você tem dois feixes de partículas sendo aceleradas, uma girando num sentido horário, outra no sentido anti-horário, e eles colidem para criar as reações de partículas", diz Takahashi, que está envolvido na experiência Alice.

"O projecto Alice é grande, gigante na verdade, com milhares de detectores. É uma colaboração de mais ou menos mil investigadores com vários detectores, e de entre eles temos os brasileiros participando desta experiência", afirma.

Segundo o professor, foi o próprio Cern - a Organização Européia de Pesquisa Nuclear, responsável pelo LHC - que convidou os brasileiros para participarem do projeto. "Ninguém se ofereceu, nós na verdade fomos convidados por eles a participar dessa experiência, porque a gente já trabalhava em outro projecto nos Estados Unidos e eu, por exemplo, tenho vários artigos publicados na área, então o pessoal da Europa achou que seria interessante que o nosso grupo entrasse na experiência, porque a gente poderia colaborar", diz Takahashi, que viaja até as instalações do projecto com frequência para coordenar o trabalho e elaborar reuniões com seu grupo de pesquisa.

"Eu tenho parte da minha equipa que fica lá, passa períodos de três a seis meses, volta e depois vai novamente. Para pagar as nossas viagens e as bolsas dos nossos alunos, contamos com as agências de fomento, como a FAPESP, no caso dos estudantes de São Paulo, e o Ministério de Ciência e Tecnologia".

Experiência semelhante teve o investigador do Centro Brasileiro de Pesquisas Físicas (CBPF) Gilvan Augusto Alves, participante do projecto CMS (sigla em inglês para Solenoide de Múon Compacto). "O CBPF já participava, desde 1991, de um projecto semelhante nos Estados Unidos, no acelerador de partículas do Fermilab, numa experiência chamado D0. Por esse motivo, fomos convidados, em 2003, a participar na fase final de construção do CMS".

A experiência conta hoje com mais de 3 mil investigadores e estudantes de pós-graduação e consiste num conjunto de detectores que medem as propriedades físicas, como momentum e energia, das centenas de partículas produzidas em colisões de protrões contra prótões em seu interior.

"A experiência CMS começou a ser construído por volta de 1998. Quando nosso grupo iniciou os trabalhos em 2003, boa parte dos detectores já havia sido construída ou estava em construção. Por esse motivo, trabalhamos inicialmente na finalização de alguns detectores de partículas, como o detector Castor, que mede a energia de partículas produzidas a baixos ângulos, e também na elaboração de software para a monitoração dos dados produzidos nas colisões protão-protão", explica Alves.

Aatualmente, o grupo está envolvido tanto na elaboração de softwares para a monitoração dos dados como na recolha de informações junto à experiência CMS no LHC, através de visitas periódicas ao Cern. "Também temos um projecto, aprovado pela Finep, para a construção de mais um detector de partículas semelhante ao Castor", diz.

Resultados inesperados

O CMS começou a sua recolha de dados na máxima energia do LHC - 7 trilhões de electrões-Volt (7 TeV) - em 30 de Março. "Deve-se ter em mente que uma experiência com essa complexidade demora vários meses somente na fase de calibração dos detectores. Mas mesmo com o curto tempo desde o início, uma série de resultados interessantes e até inesperados já foram produzidos", diz o investigador.

Ele cita a observação, divulgada no mês passado, de uma correlação angular de longa distância entre partículas produzidas em colisões de alta multiplicidade, com mais de 110 partículas numa colisão.

Um tipo de correlação semelhante só havia sido observado antes em colisões de íões pesados no acelerador RHIC, o Colisor Relativístico de Iões Pesados, mas nunca em colisões protão-protão. "O que esperamos agora é observar partículas ainda não vistas, como o bosaõ de Higgs, e quem sabe novos fenómenos, para os quais teremos que descobrir sua origem e interpretação", completou Alves.

Longe do cinismo natural da ciência, o professor Takahashi, do projecto Alice, confessa que só o facto de ser possível reproduzir as experiências em laboratório já é algo surpreendente.

A partícula de Deus

O físico britânico Peter Higgs postulou há mais de 40 anos a existência de uma partícula que explicaria a existência de massa nos átomos. Ele não gosta do termo "partícula de Deus" , pois tem medo de que algumas pessoas se sintam ofendidas. A expressão foi cunhada pelo Nobel de Física Leon Lederman, que disse que a sua descoberta unificar a compreensão da física de partículas e ajudar os seres humanos a "conhecer a mente de Deus".

O próprio Higgs já afirmou que espera que a partícula seja registada pela primeira vez em breve. Contudo, o próprio físico britânico disse anteriormente que ficaria "muito, muito intrigado", caso a existência da partícula jamais venha a ser provada, porque ele não consegue imaginar o que mais explicaria a massa das partículas.

fonte: terra

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