quinta-feira, 24 de novembro de 2011

Descodificado o genoma do ácaro-aranha, uma praga agrícola


O ácaro-aranha sobre uma folha de roseira

Embora tenha menos de um milímetro de comprimento, o ácaro-aranha não é nada esquisito com o que come. Entre as mais de 1100 plantas de que se alimenta, encontram-se pelo menos 150 com importância agrícola – como o milho, tomate, soja, morangos, pimentos, pepinos, maças, uvas, citrinos ou as rosas. A descodificação do genoma desta praga agrícola, publicada na revista “Nature”, por uma equipa multinacional que inclui dois portugueses, permitiu revelar alguns truques da sua flexibilidade alimentar.

Autêntica dor de cabeça para os agricultores de todo o mundo, incluindo os portugueses, que o enfrentam de norte a sul do país, o ácaro-aranha (“Tetranychus urticae”) é responsável por prejuízos agrícolas de milhões de euros por ano. A descodificação e estudo do seu genoma, publicado na edição de quinta-feira da "Nature", abrem agora a porta ao desenvolvimento de novas técnicas de controlo de pragas agrícolas. 

O projecto foi levado a cabo por um consórcio internacional liderado por Miodrag Grbić, da Universidade do Ontário Ocidental, no Canadá. Entre os 55 cientistas da equipa, de dez países, incluem-se Élio Sucena, do Instituto Gulbenkian de Ciência (IGC) e do Departamento de Biologia Animal da Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa (FCUL), e Sara Magalhães, do Centro de Biologia Ambiental da FCUL. 

Segredos expostos

Além de comer uma grande variedade de plantas, sendo capaz de resistir às suas toxinas de defesa, o ácaro-aranha é bastante resistente aos pesticidas. É o artrópode (um grupo que inclui as aranhas, as carraças e os insectos) que resiste maior número de pesticidas. “É esta facilidade de adaptação e de resistência que o torna uma dor de cabeça agrícola”, sublinha um comunicado de imprensa conjunto do IGC e do Centro de Biologia Ambiental da FCUL. 

O segredo desta flexibilidade alimentar e resistência aos pesticidas está na maior quantidade e maior variedade de certos genes. Os ácaros-aranha têm mais genes importantes para a digestão e degradação de toxinas produzidas pelas plantas, refere o comunicado. “Por outro lado, o genoma do ácaro-aranha parece ter incorporado genes de bactérias e fungos envolvidos na degradação de toxinas.” 

Ao que tudo indica, o ácaro-aranha tem dois grupos de genes oriundos de bactérias e fungos que são aquisições exclusivas desta espécie. Outros dois grupos de genes oriundos de fungos, diz ainda o comunicado, não são únicos do ácaro-aranha, mas existem em afídeos, insectos nocivos para a agricultura. 

“Uma das grandes questões é como é que um só ácaro consegue vencer as defesas de plantas tão diferentes”, disse à agência Lusa Sara Magalhães. “Se conseguirmos saber como faz isso, conseguimos eventualmente no futuro silenciar esses genes e fazer com que se torne mais susceptível a essas defesas.” 

Como é que os agricultores podem enfrentar os ácaros? “Ou se modificam as plantas das quais se alimentam, usando plantas transgénicas, ou se usariam ácaros transgénicos que conseguiriam suplantar os tradicionais que atacam as plantas”, disse ainda Sara Magalhães.

Também faz uma teia

Outro segredo do ácaro-aranha revelado neste estudo é que o seu genoma, com cerca de 18 mil genes, está bastante concentrado. “Mas a história evolutiva contada pelo genoma desta espécie não desilude: por um lado, tem um número elevado de genes únicos – os que lhe conferem resistência a pesticidas; por outro, parece ter perdido um grande número dos genes normalmente partilhados entre artrópodes. Se todas as espécies são ‘especiais’ porque têm um genoma único, o ácaro-aranha é ‘especialíssimo’ na medida em que partilha menos genes do que é costume com outras espécies do seu grupo, tendo uma proporção maior de genes que são só seus”, lê-se no comunicado. 

O ácaro-aranha tem ainda a particularidade de produzir uma teia - daí o seu nome. Mas a teia, que nada tem a ver com a das aranhas, é usada para protecção, como barreira contra intempéries e predadores. O estudo do seu genoma revelou que há 17 genes envolvidos na produção de proteínas para a teia. Ela é tão resistente como outros materiais naturais, mas as suas fibras são menos espessas. Mais um segredo que pode vir a ser usado na produção de novos materiais. 

fonte: Público

Sem comentários:

Enviar um comentário