O que resta da supernova SN1006, que está a 7000 anos-luz de nós (NASA)
Na noite de 30 de Abril para 1 de Maio de 1006, astrónomos de todo o mundo observaram, à vista desarmada, o acontecimento estrelar mais brilhante no céu de que há memória até hoje. A estrela SN1006 — que os egípcios disseram ter um quarto do brilho da Lua Cheia e três vezes o tamanho de Vénus e os chineses garantiram ter sido visível durante três anos — apareceu de repente. Agora, mais de mil anos depois, concluiu-se que na sua origem esteve provavelmente a colisão, ou casamento, de duas estrelas.
A 7000 anos-luz de distância da Terra, na direcção da constelação do Lobo, a SN1006 é uma supernova. Normalmente, estes objectos extremamente brilhantes resultam da explosão de uma estrela supergigante, o que ocorre na última fase da sua vida e que lança para o espaço grandes quantidades de matéria. Durante algum tempo, as supernovas permanecem no céu como estrelas muito brilhantes, mas, à medida que a sua temperatura e o brilho diminuem, vão perdendo esse encanto. Dependendo da massa que tinha a estrela do início da sua vida, a supernova transforma-se depois numa estrela de neutrões ou num buraco negro.
Mas no caso da SN1006 as coisas passaram-se de maneira diferente. Pertence a um tipo especial de supernovas (as Ia), que surgem quando uma anã branca — uma estrela como a nossa mas na última fase da vida, já moribunda, em que sobra só um “caroço” e o resto foi lançado para o espaço — ganha massa até ficar 1,4 vezes do “tamanho” do Sol. Na Via Láctea, a nossa galáxia, além da SN1006, conhecem-se apenas outras três supernovas deste tipo: a supernova de Tycho Brahe (SN1572), a de Kepler (SN1604) e a SN185.
Para atingir a massa suficiente para explodir numa supernova, uma anã branca tem de estar acompanhada por uma estrela ainda numa fase inicial da vida, à qual vai roubando matéria. Ou tem de ter uma companheira igual a si própria (outra anã branca) e fundir-se com ela. Em qualquer destas duas hipóteses, o resultado é uma explosão e o nascimento de um objecto muito brilhante. Só que no primeiro caso a estrela companheira sobrevive ao roubo pela anã branca e os seus restos podem ainda encontrar-se ao lado da supernova que entretanto se formou. E no segundo caso, as duas anãs brancas desaparecem na fusão e transformam-se numa nova estrela.
Em 2004, o grupo de cientistas, que agora publicou o estudo sobre a SN1006 na revistaNature, analisou a supernova de Tycho Brahe e encontrou a seu lado a estrela que terá sido a companheira sugada. Esses resultados levaram a equipa, do Instituto de Astrofísica de Canárias (IAC) e da Universidade de Barcelona, a pensar que a SN1006 podia ter nascido da mesma maneira — e os cientistas foram à procura dessa estrela que se teria encontrado com uma anã branca e dado origem à supernova.
“A nossa intenção era encontrar a companheira da supernova de 1006. Para nossa surpresa, não a encontramos”, diz Pilar Ruiz-Lapuente, astrofísica da Universidade de Barcelona, citada num comunicado do IAC.
O estudo, feito com um espectrógrafo de alta resolução instalado num dos telescópios do Observatório Europeu do Sul, no Chile, permitiu analisar diversos tipos de estrelas à volta do local da explosão. Estrelas gigantes, subgigantes e anãs foram estudadas, mas, de todas, apenas quatro estão à mesma distância do que resta da supernova de 1006 e todas são gigantes, sem vestígios de terem sido sugadas pela estrela que lhe deu origem. Portanto, nenhuma delas é a companheira da SN1006. “Mesmo mil anos depois de ter sofrido os efeitos de uma violenta explosão deste tipo, a estrela companheira não teria a aparência normal de uma estrela gigante”, diz González Hernández, do IAC. “Estes resultados, com outros anteriores, permitem supor que a fusão de anãs brancas deveria ser uma maneira usual de originar estas violentas explosões termonucleares”, frisa, por sua vez, Pilar Ruiz-Lapuente.
Como a supernova de 1006 está solitária, a equipa concluiu que só pode ter acontecido uma coisa. Há oito mil anos, duas anãs brancas casaram-se e a sua união foi tão violenta que, sete mil anos mais tarde, no ano 1006, a sua luz chegou-nos com grande esplendor. Hoje, a beleza da supernova, que surge como uma concha esférica de gases, não é menos deslumbrante e ainda pode ser apreciada, mas só com telescópios.
fonte: Público
Sem comentários:
Enviar um comentário