Antigas sociedades peruanas começaram a mascar folhas de coca 8 mil anos atrás, apontam evidências arqueológicas. Ruínas encontradas sob o piso de residências no vale Nanchoc, noroeste do Peru, continham coca mastigada e, junto dela, pedras ricas em cálcio.
Essas pedras teriam sido queimadas para fazer cal, mastigado com a coca para que esta libertasse mais de seus componentes químicos. Segundo estudo publicado na revista especializada Antiquity por uma equipa de arqueólogos, as descobertas indicam que a mastigação da coca começou na região simultaneamente à adopção da agricultura e milhares de anos antes do que se pensava até então.
Alcaloides
As folhas de coca contêm diversos componentes químicos conhecidos como alcaloides. Nos dias actuais, o mais conhecido entre esses componentes é a cocaína, extraída e purificada por complexos processos químicos. Mas a mastigação da folha de coca com fins medicinais é um hábito tão antigo quanto a própria civilização inca.
Outros alcaloides da coca têm efeitos levemente estimulantes, ajudam a reduzir a fome e participam do processo digestivo, além de mitigar os efeitos da falta de oxigénio em regiões de altitudes excepcionais.
Indícios prévios da mastigação da coca datavam de cerca de 3 mil anos atrás. Agora, o estudioso Tom Dillehay, da Universidade de Vanderbilt, nos Estados Unidos, e seus colegas encontraram amostras de folhas mastigadas que parecem ser de 8 mil anos atrás.
Dillehay disse que se surpreendeu por ter identificado o uso da coca "não tanto em um contexto doméstico, como se fosse usada com frequência por muita gente. Mas (identificamos) o uso restrito a algumas casas e a produção (da folha) num contexto público, e não individualizado". Mas trata-se de uma dinâmica distinta com relação a outras sociedades ocidentais, "nas quais, se você tem os meios económicos, ganha acesso a plantas medicinais", disse Dillehay.
Debate
Mais do que prover novos dados arqueológicos sobre uma civilização antiga, a descoberta fomenta uma discussão em curso actualmente. No momento em que há um esforço internacional para restringir a produção de coca nos países andinos por conta de sua associação com a cocaína, Dillehay faz um contraponto. "Muitos argumentavam que (a mastigação da coca) é uma tradição histórica relativamente recente - ou seja, dos últimos séculos ou mil anos -, mas (as novas descobertas apontam que) é uma tradição com profundas raízes sociais, económicas e até religiosas nos Andes", opinou.
O editor do periódico especializado Journal of Ethnopharmacology Peter Houghton disse à que as novas descobertas são "significativas" por mostrar que o hábito ocorria milhares de anos antes do que se pensava anteriormente. E também por encontrar folhas mastigadas e pedras ricas em cálcio nos mesmos locais (acreditava-se que o uso dessas pedras era ainda mais recente do que o da coca).
Que o consumo fosse restrito na época, como apontam as descobertas, não é algo surpreendente, comentou Houghton. "As evidências de uso disseminado (da coca) no Peru e na Bolívia são relativamente recentes. Antes, (a folha) era limitada a uma classe privilegiada", completou.
fonte: terra
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