Relatório preliminar do Censo da Vida Marinha, publicado ontem, mostra que a bacia mediterrânica sofre as maiores pressões na pesca, poluição e ocupação humana.
Crustáceos e moluscos são as espécies que dominam os oceanos; a Austrália e o Japão têm as águas mais ricas do mundo em biodiversidade, e o Mediterrâneo, aqui à porta, também é dos que têm maior abundância de espécies, mas detém ainda mais dois recordes. Berço da civilização ocidental, é o mar mais estudado de sempre, mas é também o mais ameaçado.
Estas são algumas das tendências observadas pelos cientistas que nos últimos dez anos se envolveram no projecto Censo da Vida Marinha. O relatório preliminar foi publicado ontem na revista Plos One.
O relatório final Censo da Vida Marinha, que desde há uma década mobiliza 360 investigadores em todo o mundo, será publicado em Outubro do próximo ano, inventariando pelo menos 230 mil espécies. Os cientistas sabem, no entanto, que esse valor estará aquém do verdadeiro número das espécies nos oceanos. Pelas contas já feitas, por cada espécie que se descobre no mar, há quatro que ficam por descobrir.
Este esforço de recenseamento - comparável "ao dos enciclopedistas", como o exprimiu Jesse Ausubel, co-fundador do projecto - permitiu já à equipa descobrir algumas novidades.
Uma delas tem que ver justamente com o Mediterrâneo, receptáculo por excelência de espécies migrantes. Com a aceleração do tráfego marítimo no século XIX, e com a abertura do canal de Suez, o Mediterrâneo acabou por se tornar num ponto de cruzamento de muitas espécies "estrangeiras" (600) oriundas do mar Vermelho.
Apesar da sua riqueza própria, e da chegada das novas espécies, o Mediterrâneo não está de boa saúde. A degradação dos habitats, a pesca excessiva e o aumento de espécies exóticas invasoras, favorecido pelas alterações climáticas, não anunciam nada de bom, sublinham os cientistas.
Recenseamentos anteriores davam conta de oito mil a 12 mil espécies neste mar, mas o Censo da Vida Marinha já conseguiu elevar esse número para 17 mil, o que revela riqueza. Mas as ameaças também são grandes, e são mesmo mais fortes ali do que em qualquer outro oceano do mundo, segundo as conclusões preliminares do projecto.
"Os impactos das actividades humanas são proporcionalmente mais importantes no Mediterrâneo do que nos outros mares do planeta", lê-se no relatório. A explicação está na história, já que aquela é uma região habitada há muitos milénios, mas também na geografia: o Mediterrâneo é uma bacia quase fechada.
Animais de forte carga simbólica, como cachalotes e focas- -monge, praticamente desapareceram, os golfinhos são frequentemente vítimas de redes de pesca. A degradação e perda de habitats, a ocupação humana costeira e a poluição fazem estragos. As espécies invasoras, que proliferam em detrimento das endémicas, são outro problema em expansão. A medusa americana ou a amêijoa asiática estão entre essas invasoras que causam preocupação. Com estas alterações, o perfil da biodiversidade do Mediterrâneo será diferente. Resta saber se o seu carácter pode ser preservado. Os cientistas recomendam "uma vasta análise das iniciativas que será necessário tomar para a conservação, de forma a manter mediterrânico" o Mediterrâneo.
fonte: Diário de Noticias
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