O exército de médicos e de técnicos conduziu as múmias até à sala de raio-X
Estudo inédito em Portugal vai finalmente revelar a identidade das múmias do Museu de Arqueologia.
Ao longo de dois mil anos, três múmias egípcias descansaram nos seus túmulos sem que ninguém as incomodasse. Atravessaram em silêncio centenas de dinastias de faraós e chegaram ao século XXI intactas e misteriosas. Até ontem eram figuras desconhecidas para historiadores e cientistas e foi preciso sobreviver até à era da tecnologia para revelarem a sua identidade. Os três cadáveres egípcios saíram ontem de manhã do Museu Nacional de Arqueologia e estiveram boa parte do dia encafuados num laboratório radiológico de Lisboa (Imagens Médicas Integradas) onde uma equipa de médicos e técnicos reconstituiu digitalmente as imagens dos seus corpos.
"A radiografia às múmias é um processo que já se faz há quase uma década em vários países mas, em Portugal, será a primeira vez", conta o director do Museu Nacional de Arqueologia, Luís Raposo. Centenas de milhares de fotografias tiradas com equipamentos de última geração vão permitir dentro de alguns meses reconstruir a três dimensões todas as partes dos cadáveres e revelar os grandes segredos que esconderam até agora: os seus rostos, as doenças profissionais, as feridas ou os estilos de vida.
A múmia ptolemaica sem sarcófago e de nome desconhecido, que terá vivido 200 anos antes de Cristo, foi a primeira a submeter-se ao raio-X e à TAC (Tomografia Axial Computorizada). E logo depois entrou Pabassa, a múmia mais antiga de todas (700 a 800 anos antes de Cristo) e também aquela sobre a qual mais se conhece. "Filho de Hor, Pabassa foi um sacerdote que teve em vida a missão de vestir a estátua do deus Min, divindade promotora da fertilidade", explica o egiptólogo do Instituto de Estudos Orientais da Faculdade de Letras de Lisboa Luís Araújo.
Da última múmia a entrar no laboratório só sobrou o nome: Irtieru. Tudo o resto na sua vida é, por enquanto, um mistério. Até ontem, o Museu Nacional de Arqueologia nunca permitiu sequer espreitar por entre as frechas do sarcófago. Tiveram medo que se desintegrasse ao primeiro toque. Só que agora é diferente porque as técnicas usadas são "não invasivas", permitindo entrar no túmulo sem danificar o seu interior: "Para um arqueólogo seria o mesmo que ver o que está debaixo da terra sem ter de escavar", diz Carlos Prates, que coordenou a equipa de médicos e de técnicos do laboratório.
"Com os exames a que as múmias foram sujeitas vamos ter a possibilidade de ter informação em volume, permitindo não só a sua reconstituição facial como analisar vários aspectos dos cadáveres como, por exemplo, o tórax, a coluna vertebral ou os amuletos depositados nos sarcófagos", explica Carlos Prates. O estudo baptizado como Lisbon Mummy Project vai permitir que dentro de três meses seja possível ao próximo visitante do Museu de Arqueologia ver nos monitores as imagens a três dimensões, navegar dentro dos sarcófagos e até entrar dentro de uma traqueia ou no coração de uma múmia. "É um novo capítulo que se abre", conclui o investigador.
fonte: Jornal i
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