quinta-feira, 6 de setembro de 2012

Guerra civil põe em risco sítios arqueológicos milenares na Síria


Diante de conflitos cada vez mais sangrentos, a destruição de sítios arqueológicos milenares parece ser algo secundário na Síria. Mas investigadores alertam para o perigo de extermínio de testemunhos da civilização. 

Embora se encontre em seu escritório na Universidade Livre de Berlim, o investigador alemão Dominik Bonatz, diretor do Instituto de Arqueologia da Ásia e do Médio Oriente, preferiria estar agora em Tell Fecheriye, no nordeste da Síria, à fronteira com a Turquia.

Com sua equipa de 60 pessoas, Bonatz passou cinco verões pesquisando num dos maiores e mais importantes sítios arqueológicos da região. Desde 2011, no entanto, tornou-se perigoso demais para o grupo de especialistas permanecer na Síria, e eles tiveram que retornar à Alemanha.

As escavações coordenadas por Bonatz são financiadas pela Sociedade Alemã para Pesquisa (DFG). Elas deveriam se tornar a "obra da sua vida" e ainda poderiam se prolongar por muitos anos.

Medo da devastação

Na Idade do Bronze, ou seja, entre 1500 e 1100 a.C., o local era a capital de um reino – cuja identidade os arqueólogos têm tentado descobrir. 

Além dos escritos, que comprovam a importância central de Tell Fecheriye, os investigadores encontraram vestígios de edificações administrativas da cidade, indicando que a localidade pode ter sido a capital, até hoje não identificada, do Império de Mittani.

"Estávamos à beira de descobrir o palácio real", diz Bonatz, que agora teme o pior. "Alguns dos sítios arqueológicos nas imediações de regiões de combates, como Tell Afis ou Palmyra, foram destruídos e saqueados. Tanques de guerra devastaram a herança cultural, em outros lugares peças antigas foram roubadas", conta à Deutsche Welle. Até então, Tell Fecheriye havia sido poupada. 

No entanto, há apenas um vigilante sírio cuidando da segurança do lugar. No caso de um ataque, ele nem teria como reagir.

Interseção de culturas

A Síria desempenha um papel central na pesquisa sobre a Antiguidade. Na sabedoria popular, o país é até mesmo considerado o berço da civilização, pois lá foi criado o primeiro alfabeto, ainda antes do grego. 

Uma opinião que o professor de arqueologia Jan-Waalke Meyer, da Universidade de Frankfurt, considera exagerada. Segundo ele, a importância da Síria está sobretudo na interseção de influências culturais distintas.

"Pessoas do Egito, da Anatólia, da região leste do Médio Oriente e da Mesopotâmia do Sul se encontraram na Síria. Essa mistura tipicamente síria serviu também de fundamento para a constituição da cultura europeia", diz Meyer.

O investigação faz escavações em Tel Chuera, na fronteira turco-síria, há 15 anos. O nome desta localidade está atrelado, entre os especialistas, ao de Max Freiherr von Oppenheim (1860-1946), um dos primeiros descobridores e investigadores de culturas da Antiguidade Oriental na Síria. 

Em suas viagens de pesquisa, ele chegou à Síria no início do século XX e encontrou as ruínas de Tell Chuera, tendo sido o primeiro a reconhecer a importância histórica delas.

Isolamento devido à guerra

A cidade de Rakka fica a 120 quilómetros de distância de Tell Chuera. Apesar do isolamento do local, o perigo existe: "Não há mais nenhum lugar seguro na Síria. Até a população rural está direta ou indiretamente envolvida na guerra. Por um lado, devido ao terror causado pelos combates, mas também porque os alimentos estão três vezes mais caros e o combustível está escasso, de forma que sistemas de irrigação não funcionam mais", descreve Meyer.

Ele fala semanalmente ao telefone com investigadores sírios e com o vigilante que cuida do sítio arqueológico, que certa vez já teve que defender o local de invasores. Desde o ataque, o vigilante e sua família vivem com medo.

Até o início da guerra, cinco institutos arqueológicos de universidades alemãs realizavam pesquisas na Síria. O Instituto Arqueológico Alemão (DAI, na sigla original), que mantém há 30 anos uma dependência em Damasco, teve que suspender suas pesquisas de campo.

A investigadora Karin Bartl mudou-se com seu instituto para Aman, na Jordânia. A coordenadora das escavações pesquisa há muitos anos o sítio neolítico de Shir, entre outros. 

"Uma vez que, desde o início, as cidades sírias de porte médio como Homs e Hama se tornaram centro de conflitos, os trabalhos tiveram que ser interrompidos. Desde maio de 2011 o instituto fechou suas portas para o público", divulgou o DAI.

Anos de pesquisa em perigo

Caso os sítios arqueológicos de Tell Fecheriye sejam de facto devastados, isso significaria o fim de ano de pesquisas para Bonatz. "Não faria mais sentido dar continuidade ao trabalho", diz ele, que não conta com um retorno a curto prazo à Síria. "A situação ainda vai continuar instável por muito tempo", acredita o pesquisador.

Os prognósticos de Meyer, da Universidade de Frankfurt, também são sombrios. Ele não crê num fim da violência naquele Estado árabe. 

"Não vejo uma solução pacífica para o país. Mesmo a constituição de um novo governo não traria a paz imediata", observa. Outros arqueólogos, conta, já abandonaram a ideia de trabalhar na Síria e foram há procura de novos projetos. 

"Ainda estou em compasso de espera", diz Bonatz. Pelo menos de Tell Feheriye ele não quer, de forma alguma, abdicar.


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