terça-feira, 25 de setembro de 2012

Os eunucos vivem mais do que os homens não castrados

Os cantores líricos castrados da Itália dos séculos XVII e XVIII, tais como o célebre Farinelli, não permitiram revelar diferenças significativas de longevidade entre eles e os cantores não castrados

Os cantores líricos castrados da Itália dos séculos XVII e XVIII, tais como o célebre Farinelli, não permitiram revelar diferenças significativas de longevidade entre eles e os cantores não castrados (DR) 

Os homens castrados que serviram os reis da Coreia ao longo de séculos viveram, em média, 14 a 19 anos mais do que os seus congéneres não castrados, conclui um estudo publicado ontem na revista Current Biology. Estes resultados sugerem que as hormonas masculinas encurtam a vida dos homens, concluem Kyun-Jin Min, da Universidade de Inha (Coreia do Sul), e colegas.

Em muitas espécies, as fêmeas vivem mais do que os machos e pensa-se que a responsável por esta diferença seja a hormona masculina testosterona, ao encurtar a vida dos machos. Isto pode ser devido ao seu efeito negativo sobre o sistema imunitário e ao facto de ser um factor de risco cardiovascular. Para mais, sabe-se que a castração prolonga a vida dos machos de muitas espécies animais. Porém, nos seres humanos, os estudos da relação entre longevidade e reprodução masculinas não têm sido conclusivos.

Uma maneira de abordar a questão tem sido justamente através dos efeitos a longo prazo da castração masculina. Um estudo realizado na década de 1990, por exemplo, mostrou que a castração permitira prolongar em 14 anos a vida de doentes internados num hospital psiquiátrico quando comparados com os doentes não castrados. Mas, como salientam os autores no artigo agora publicado, o estudo dos castrati - os cantores líricos castrados da Itália dos séculos XVII e XVIII, tais como o célebre Farinelli - não permitiu revelar diferenças significativas de longevidade entre eles e os cantores não castrados.

Os cientistas sul-coreanos viraram-se desta vez para os registos genealógicos da corte imperial coreana durante a dinastia Chosun, de 1392 a 1910. "A manutenção dos registos genealógicos era importante", escrevem, "porque atestavam da pertença à nobreza." E os eunucos da corte - que devido a uma mutilação acidental ou deliberada tinham perdido os testículos (e por vezes também o pénis) e se tinham tornado altos funcionários ao serviço dos monarcas - podiam casar-se e adoptar "rapazes eunucos ou raparigas normais". Tinham portanto uma linhagem apesar da sua infertilidade e também eles mantinham metódicos registos genealógicos. Que se encontram reunidos num documento, o Yang-Se-Gye-Bo. "Tanto quanto sabemos", escrevem os cientistas na Current Biology, "este é o único repositório no mundo de histórias de famílias de eunucos."

Cruzando estes dados com outros documentos oficiais, que registavam o dia-a-dia no palácio imperial, Kyun-Jin Min e a sua equipa conseguiram confirmar a idade, na altura da morte, de 81 dos 385 eunucos que constam do Yang-Se-Gye-Bo ao longo de cerca de cinco séculos de história. E puderam assim concluir que a longevidade média desses eunucos foi de 68 a 72 anos. Ou seja, ultrapassou em 14 a 19 anos a longevidade "de homens não castrados de status socioeconómico semelhante".

O contraste entre a longevidade dos eunucos e a dos homens não castrados é ainda reforçado pelo facto de três desses eunucos terem chegado a centenários - atingindo, respectivamente, os 100, 101 e 109 anos. Ora, salientam ainda os autores, visto que, actualmente, a proporção de centenários é de um em 3500 no Japão e de um em 4400 nos EUA, isso significa que essa proporção, nesse grupo de eunucos coreanos que viveram há séculos, era 130 vezes maior do que é hoje em dois dos países mais desenvolvidos do mundo!

Mas, perguntam os autores, será mesmo a ausência de testosterona a responsável pela longevidade dos eunucos? Não será antes o seu estilo de vida pacato e protegido? Não é muito provável, respondem. Por um lado, a maioria dos eunucos vivia fora do palácio e só lá entrava quando estava de serviço. E por outro, a longevidade da família real - que, essa sim, passava a vida fechada naqueles muros - revelou ser muito menor: os reis viviam em média 44 a 50 anos e os membros masculinos da família real 42 a 48 anos... 

Resultados deste tipo poderão permitir perceber melhor o envelhecimento humano, dizem os autores. Mas entretanto, acrescentam em comunicado, os homens não devem esquecer que, "para ter uma vida longa e saudável, convém evitar o stress e aprender o que podem junto das mulheres."

fonte: Público

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