sexta-feira, 5 de outubro de 2012

Brasileiros vão decifrar genomas do papagaio e do sabiá-laranjeira


Não é todo dia que uma imagem de Zé Carioca ilustra uma apresentação sobre genoma, mas o malandro arquetípico da Disney tinha um bom motivo para figurar no Powerpoint de Francisco Prosdocimi, da UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro): o tema era o genoma "dele". 

Ou melhor, o do papagaio-verdadeiro (Amazona aestiva), que está entre as espécies mais comuns de ave em cativeiro. O objetivo de Prosdocimi e seus colegas é vasculhar o ADN da ave em busca de pistas que ajudem a explicar sua proverbial tagarelice. 

Para atingir esse objetivo, o papagaio-verdadeiro não é o único alvo. O grupo de cientistas, baptizado de Sisbioaves, pretende sequenciar (grosso modo, "soletrar") o genoma de outras espécies tipicamente brasileiras, como o sabiá-laranjeira e o bem-te-vi. 

Em comum, essas aves possuem o chamado aprendizagem vocal -a capacidade, similar à dos seres humanos, de aprender padrões de vocalização ao longo da vida. 

Detalhes sobre o projeto foram apresentados durante o 58º Congresso Brasileiro de Genética, em Foz do Iguaçu. 

"A gente sabe que a aprendizagem vocal é polifilético [ou seja, evoluiu mais de uma vez em linhagens sem parentesco próximo]", explica Claudio Mello, brasileiro que trabalha na Universidade de Saúde e Ciência do Oregon (Estados Unidos). 


"Portanto, se encontrar genes relevantes para esse comportamento que são partilhados entre os vários grupos de aves e os humanos, provavelmente isso quer dizer que eles representam a base de aprendizagem vocal", diz Mello. 

Na maioria das aves, afirma Mello, existe o chamado período crítico de aprendizagem - uma fase da "infância" da ave na qual ele precisa ser exposto ao canto de outro animal para que ele aprenda a cantar de forma apropriada, coisa que também se verifica no caso da fala humana. Já os papagaios parecem ser mais versáteis, sendo capazes de aprender a imitar sons humanos em praticamente qualquer fase de sua vida. 

A estimativa de Prosdocimi e de sua colega Maria Paula Schneider, da UFPA (Universidade Federal do Pará), é que a leitura dos genomas do papagaio e do sabiá-laranjeira esteja concluída em meados do ano que vem. 

Segundo o investigador da UFRJ, que é bioinformata (especialista na análise computacional de dados biológicos), espera-se que as aves tenham genomas relativamente compactos, com menos da metade do tamanho do genoma humano. 

Os investigadores ainda não encontraram, nos papagaios, o equivalente ao gene FOXP2, hoje um dos grandes candidatos a influenciar a capacidade humana para a fala. Mas não é só o lado vocal que interessa aos cientistas. 

Prosdocimi destaca que os papagaios são inteligentes de modo geral. E vivem muito, passando dos 70 anos, o que traria pistas sobre as bases genéticas da longevidade.


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