Fabricar animais com aparência humana traz dúvidas éticas
Um painel de especialistas britânico quer um maior controlo nas experiências de investigação onde se utiliza material humano, como células ou ADN, em animais, antes que projectos científicos perigosos ao nível ético sigam em frente por falta de legislação.
O documento publicado nesta quinta-feira chamado Animals Cointaining Human Material (Animais que Contêm Material Humano), é o resultado de dois anos de trabalho de um conjunto de especialistas em genética, filosofia, ética, ciências sociais, lei ou biomedicina. E é uma reacção à investigação de ponta em saúdes médicas, cuja tecnologia já é capaz de produzir ratinhos com síndrome de Down, ao terem um cromossoma humano a mais no seu genoma.
O painel foi encarregado pelo Governo e o relatório foi publicado pela Academia de Ciências Médicas do Reino Unido. “Não queremos que os cientistas causem problemas futuros ao pisarem a marca do que é publicamente aceitável”, disse à Nature News Robin Lovell-Badge, um biólogo da área do desenvolvimento que pertence ao Instituto Nacional para a Investigação Médica de Londres, e é um dos membros do painel.
O relatório sugere três categorias em relação à permissão de projectos de investigação. Uma em que os projectos são facilmente permissíveis, outra em que as experiências necessitam de um comité de avaliação para aprovar os projectos e uma terceira que bane completamente as ideias de investigação.
No nível vermelho, a terceira categoria, o relatório pede para banir experiências em que se coloque células nervosas humanas em outros primatas, permitindo que estes animais tenham comportamentos mais humanos.
A justificação ética para esta proibição é simples: se estes animais desenvolverem capacidades humanas como razão ou consciência de si próprios, teriam um estatuto moral semelhante ao das pessoas ou dos primatas superiores (como o gorila, o orangotango ou o chimpanzé), e não poderiam ser alvo de experiências científicas na maioria dos países.
O painel também sugere banir experiências onde se produzam embriões a partir de células embrionárias humanas e de primatas não humanos, ou a produção de um híbrido humano com outro animal.
Martin Bobrow, geneticista humano da Universidade de Cambridge que presidiu ao grupo de trabalho, disse à BBC News que “ainda ninguém fez nenhuma destas experiências”, mas o painel quer que haja directrizes sobre estes assuntos antes que tal seja possível de acontecer.
Os projectos que teriam de ter um comité especial de avaliação, incluem modificar cérebros de outros animais, que não fossem primatas não humanos, de forma a terem algumas funções parecidas com as que acontecem nos humanos; gerar ou propagar células humanas derivadas dos óvulos ou dos espermatozóides em outros animais, onde não é possível acontecer a fertilização; criar animais com características claramente humanas como a pele ou a fala.
“As pessoas preocupam-se quando se toca no cérebro, nas células germinais ou nas características que ajudam as pessoas a reconhecer o que é uma pessoa, ao contrário do que é um rato ou um coelho”, disse Bobrow citado pelo Guardian.
O painel quer principalmente colocar a comunidade científica a discutir estes assuntos. Segundo a Nature News o documento também teve impacto no estrangeiro, em países como a Alemanha ou os Estados Unidos.
O presidente da Royal Society, Paul Nurse, defende que este tipo de investigação necessita de uma discussão aberta. “A Royal Society apoia as recomendações feitas neste relatório, especialmente o pedido para a criação de um grupo nacional de especialistas. Um escrutínio apropriado e uma regulação deste campo em desenvolvimento irá assegurar à sociedade o benefício total destes avanços”, disse Paul Nurse ao Guardian.
fonte: Público
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