A terra dos vikings poderá não ter sido tão fria como se pensava, o que vai obrigar a mudar algumas das representações deste povo. Tudo graças às informações recolhidas em sedimentos retirados do fundo de um lago.
Lamas depositadas no fundo de um lago perto de Narsaq, uma pequena cidade da Gronelândia com 1500 habitantes, e os restos de mosquitos que ali ficaram presos, estão a ajudar os cientistas a mudar a imagem que temos dos vikings. De acordo com a investigação publicada esta semana na revista Geology a, ilha da Gronelândia tinha temperaturas quentes e praticamente nunca estava coberta por neve e gelo, o que acaba por justificar o facto de Eric, o Vermelho (norueguês que tornou a Gronelândia o país dos navegadores nórdicos por volta do ano 986) chamar a esta zona a "Terra Verde".
A confirmarem-se os dados deste trabalho a imagem deste povo vestindo peles e capacetes de ferro e vivendo em regiões com temperaturas baixas pode ter de ser alterada, pois a reconstrução de quase três mil anos de história climática do sul do país mostra que era uma zona onde as temperaturas rondavam os dez graus.
"Havia quem especulasse que os nórdicos colonizaram a Gronelândia durante um período quente, mas não existia nenhuma indicação sobre a temperatura local [no século X] que confirmasse isso. Agora, algumas pesquisas sugerem que era verdade", afirmou Yarrow Axford, investigador da Universidade de Northwestern (EUA) e o principal autor do estudo, que acrescentou ser este um "mistério climático".
A presença dos vikings (expressão usada como referência aos exploradores, guerreiros e comerciantes nórdicos que invadiram e colonizaram grandes áreas da Europa e das ilhas do Atlântico Norte entre o final do século VIII e o século X) na Gronelândia não levanta dúvidas aos investigadores graças às descobertas arqueológicas e à datação por radiocarbono. Mas, sempre existiram duas dúvidas: qual a razão para Eric, o Vermelho ter chamado a esta ilha "Terra Verde" e por que colonizaram a região e depois a abandonaram.
Uma parte dos sedimentos retirados do fundo do lago Narsaq © G. Everett Lasher/Northwestern University
Ao longo dos anos muitos historiadores justificavam este movimento com o facto de que entre os séculos X e XIII (conhecido como o Período Quente Medieval) as temperaturas terem sido supostamente tão altas como hoje em dia. Depois, no século XIV, começou a Pequena Idade do Gelo, que provocou uma período de crises que ficou conhecido como a "Grande Fome" (entre 1315 e 1317 chuvas intensas e consecutivas na Europa impediram as culturas de se desenvolver) e terá, segundo os defensores da tese, contribuído para o fim da civilização viking na Gronelândia e América do Norte.
Axford provou esta teoria estudando os sedimentos formados no fundo do lago situado em Narsaq, situado numa região que terá feito parte da "Terra Verde" durante pelo menos três mil anos. No lago foram-se acumulando pólen, insetos mortos, fragmentos de vegetação e outros restos orgânicos, que agora ajudam a compreender como era o clima e a ecologia do Ártico num passado distante.
Por exemplo, a proporção de isótopo de oxigénio, nitrogénio e carbono encontrado nos restos de animais e plantas depende diretamente do clima da época em que viviam. Em particular, quanto maior é a proporção de oxigénio "pesado" mais elevada era a temperatura. Recorrendo a esta ideia a equipa de Yarrow Axford analisou a composição isotópica dos mosquitos fossilizados extraídos das camadas de lama, formada entre 900 e 1400 anos D.C. no fundo do lago.
Essas medições mostraram que a proporção de oxigénio-18 era significativamente maior do que nos restos orgânicos mais antigos preservados nas camadas inferiores. Em média, naquela época, as temperaturas eram um grau e meio mais altas do que no início da Idade Média, e semelhantes às temperaturas da Gronelândia atualmente. A era quente terminou no fim do século XIV, quando o clima se tornou instável e a ilha começou a ser coberta por gelo.
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