segunda-feira, 5 de março de 2012

A nova caça ao tesouro



VIDA E MORTE DO SS MANTOLA

Conheça a curta trajetória do navio britânico e saiba como a Odyssey o encontrou 

Em 10 de outubro, a empresa americana Odyssey confirmou a localização dos destroços do navio britânico SS Mantola, afundado em 1916 por um submarino alemão. Depois de 94 anos desaparecido, foi localizado perto da costa oeste da Irlanda, a 2,5 mil metros de profundidade. Um mês antes, a mesma companhia havia encontrado o SS Gairsoppa, desaparecido desde a Segunda Guerra, a 4,7 mil metros da superfície. Para chegar aonde nenhum caçador de tesouros havia chegado antes, a Odyssey usou equipamentos ultratecnológicos, antes exclusividade de investigadores e petrolíferas. 

O que desperta interesse pelos navios não é tanto sua importância histórica, mas sua carga: o Mantola e o Gairsoppa levavam, respectivamente, 17 e 200 toneladas de prata. Somados, os tesouros valem mais de US$ 260 milhões. Uma missão para a Odyssey, única empresa no mundo especializada na caça de navios em oceano profundo. O mais fundo que um mergulhador humano já atingiu foi 320 metros, muito longe de alcançar os quase 5 quilómetros que os robôs da Companhia terão que descer para chegar ao SS Gairsoppa, cujo tesouro começa a ser retirado em maio que vem. A empresa usa um radar subaquático para localizar os destroços, e um veículo operado remotamente para retirar cargas. “Eles funcionam como olhos e mãos de nossos arqueólogos”, diz Mark Gordon, presidente da companhia. 

A Odyssey foi fundada em 1994 pelo explorador e caçador de tesouros americano Greg Stemm. Ele já havia actuado, por conta própria, no final dos anos 80, na exploração da ruína de Tortugas, um navio possivelmente espanhol do século XVII, de onde tirou mais de 17 mil artefatos, como sinos de bronze, barras de ouro, jarras, moedas antigas e medalhões. Hoje, tem 240 funcionários, entre arqueólogos, pilotos, engenheiros e marinheiros. Sua equipa de investigadores analisa documentos e mapas antigos procurando por embarcações esquecidas. 

Em 17 anos de actuação, já foram encontrados mais de 300 navios submersos, de antigas embarcações fenícias a barcos modernos. A primeira missão de sucesso aconteceu em 2003, quando foi descoberto o SS Republic, o maior navio de toda a Guerra Civil americana. Foram recuperadas mais de 51 mil moedas de ouro. “Costumamos procurar por cargas que valham mais de US$ 50 milhões”, diz Mark Gordon. Negócio de ouro mesmo, já que a Odyssey costuma ficar com a maior parte dos objetos. 

ACHADO NÃO É ROUBADO 

Tanto os destroços do SS Mantola quanto os do Gairsoppa pertencem ao governo britânico. Sua exploração faz parte de um contrato entre o governo e a Odyssey que permite que a empresa fique com 80% da prata. O governo diz que não é mau negócio — ele recupera parte do tesouro sem ter que gastar dinheiro dos contribuintes para isso. 

Segundo as leis internacionais, um barco naufragado continua a pertencer ao país de onde saiu. Quando uma empresa é contratada para realizar o processo de resgate, ela deve receber um pagamento referente aos seus custos e aos riscos que correu. “Um único dia de trabalho custa entre dezenas e centenas de milhares de dólares, dependendo da profundidade, localização e condições do navio”, afirma Gordon. Ao encontrar um navio valioso, a primeira ação da Odyssey é procurar pelos donos dos destroços para propor um acordo de exploração — isso se já não tiverem sido contratados. Quando não é possível identificar os donos, o caso pode acabar na justiça. 

Em 2007, a empresa encontrou uma ruína não identificada com 17 toneladas de prata. Quando transferiu o tesouro para os EUA e clamou sua posse, o governo espanhol discordou. Entrou na justiça americana alegando que o navio era o Nuestra Señora de Las Mercedes, embarcação espanhola que afundou em 1804 e transportava cargas entre o país e suas colónias. 

A carga até hoje é disputada por descendentes dos comerciantes do Las Mercedes e pelo governo peruano, que afirma que as riquezas foram roubadas de seu território. A Odyssey diz que, se a identidade do navio for provada, irá negociar com as famílias dos comerciantes, que seriam as reais donas da carga. 

Grupos de arqueólogos acusam a empresa de fazer pirataria disfarçada de pesquisa científica. Eles se baseiam na Convenção da Unesco sobre a Proteção do Património Cultural Subaquático, firmada em 2001, que diz que os naufrágios não devem ser alvos de exploração comercial, mas sim de estudos arqueológicos. Para se defender, a Odyssey caracteriza seu trabalho como “arqueologia marinha comercial”. Em sua visão, a venda de parte dos objetos encontrados, como as moedas de prata, é o único modo de sustentar o trabalho. “O fundo do mar não é um ambiente inofensivo. Os navios podem ser destruídos por redes de pescadores e pela poluição”, diz Gordon. “Ao retirar a carga, conseguimos estudar e exibir essa história para o público.” 

Os novos caçadores de tesouro não querem ser vistos só como caçadores de tesouro. Enquanto tentam convencer arqueólogos de que também dão valor à história, as moedas de prata não param de cair em sua conta. E a previsão é de alta para eles: segundo a Unesco, existem mais 3 milhões de navios naufragados no mundo. 


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