sábado, 2 de abril de 2016

O unicórnio existiu mesmo. E foi nosso contemporâneo


O Elasmotherium sibiricum era um parente dos modernos rinocerontes

Datação de fósseis descobertos no Cazaquistão mostra que a espécie se extinguiu há 29 mil anos e não há 350 mil, como se pensava

Os sábios da Antiga Grécia viam o unicórnio como um ser real que vivia lá longe, na Índia, e mágico também: o seu corno tinha extraordinários poderes curativos. Talvez por isso, o mito perdurou no imaginário dos povos, povoou a literatura e os filmes e encheu de belas ilustrações os livros infantis. Só que o unicórnio, aquele a que chamam siberiano, existiu mesmo e a descoberta de que afinal não se extinguiu há 350 mil anos, como se pensava, mas apenas há cerca de 29 mil pode afinal ajudar a explicar uma das possíveis origens do mito: nessa altura, já o Homo sapiens andava há muito por toda a Eurásia.

Foi a descoberta na região de Pavlodar, no Cazaquistão, de fósseis bem preservados de um crânio de Elasmotherium sibiricum, o tal unicórnio siberiano, um velho parente dos modernos rinocerontes, que tinha um corno de grande dimensão a sair da parte superior do focinho que trouxe à luz do dia a nova peça do puzzle dos mamíferos pré-históricos.

O achado foi datado por radiocarbono pelos paleontólogos Andrey Shpanski, da Universidade Estatal de Tomsk, na Rússia, e Valentina Aliyassova, do Instituto Universitário de Pavlodar. E, para sua grande surpresa, em vez de mais de 350 mil anos, como seria de esperar, a idade dos fósseis ficou-se por muito menos, entre os 26 mil e os 29 mil anos.

Ao contrário do belo cavalo branco do mito, o unicórnio siberiano era um animal entroncado, a lembrar os seus primos modernos, mas maior ainda: dois metros de altura por 4,5 de comprimento, quatro toneladas bem medidas e um corno único que se elevava a partir do focinho, com algumas dezenas de centímetros - não se sabe ao certo quantas.

Os fósseis que conduziram à primeira descrição deste animal pré--histórico foram descobertos no início do século passado e achados posteriores, de dentes e de partes do esqueleto, permitiram compor uma imagem razoavelmente completa deste animal, que deambulava pelos territórios dos continentes europeu e asiático e que foi contemporâneo dos tigres-dentes--de-sabre e dos mamutes.

No estudo que publicaram ontem na revista científica American Journal of Applied Sciences, os autores explicam que os fósseis estavam muito bem preservados, e tudo indica que pertenceriam a um macho adulto, já velho. A sua causa de morte não pôde ser apurada.

De acordo com os autores, aquele animal poderia pertencer a uma população da espécie que sobreviveu durante mais milénios, por comparação com outras populações que foram desaparecendo da Eurásia por perda de habitat, ou outros problemas ecológicos e climáticos. A questão, na prática, coloca-se e, para lhe responder, Andrey Shpanski avança uma possibilidade: "Provavelmente, a região ocidental da Sibéria tornou-se um refúgio, onde este rinoceronte perdurou durante mais tempo em relação às outras populações da espécie." Mas Shpanski admite que esta não é a única explicação possível. "Há uma outra hipótese, a de que estes animais tivessem a capacidade de migrar e estabelecer-se temporariamente em regiões mais favoráveis", adianta.

Certo é que a recente datação vem colocar novas cartas em jogo, que poderão ajudar a desvendar alguns aspetos da ecologia da espécie e, quem sabe, a causa da sua extinção.


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