Poderão os Neandertais ser nossos antepassados? Ou pertencem a uma espécie primitiva muito inferior ao homem moderno? Eis uma questão a que a ciência ainda não conseguiu responder com segurança. Contudo, vários cientistas perseguem a resposta afincadamente e, enquanto para uns a mera hipótese de que descendemos dos Neandertais é simplesmente ultrajante, para outros é uma reviravolta aliciante na história da evolução. Por agora, pensa-se que a resposta está no código genético Neandertal.
© Neandertal (Wikicommons, Danny Vendramini)
Há muito tempo que a História (pelas mãos de Marcellin Boule, o antropólogo que estudou o primeiro esqueleto Neandertal encontrado) nos criou a imagem do homem Neandertal como um ser peludo e selvagem que não andava ereto, não tinha linguagem nem comportamentos sociais evoluídos. Muito mais semelhante a um macaco do que a um ser humano atual. Porém, à medida que a ciência evoluiu e que mais exemplares de esqueletos de Neandertal foram encontrados e estudados, começou a surgir uma nova perspetiva.
© Comparação craneana de Homo Sapiens e Neandertal (Wikicommons, Hairy Museum Matt)
Inicialmente, admitiu-se que a espécie Neandertal se extinguiu aquando do seu encontro com os Homo Sapiens, colocando-se a hipótese de que, quando estes últimos migraram de África até à Europa e se depararam com os Neandertais, terá existido um confronto que levou à sobrevivência do mais forte e evoluído, o Homo Sapiens. Por outro lado, é também ponderado que a presença dos Homo Sapiens terá levado à diminuição dos alimentos e recursos, que estes obtinham com meios mais evoluídos, deixando os Neandertais sem forma de subsistência, e levando-os igualmente à extinção, mesmo sem um confronto direto.
Todavia, atualmente começam a surgir teorias alternativas. Alguns cientistas contestam que não haveria motivo para confronto e que ambas as raças, apesar das suas diferenças, se terão percecionado como semelhantes e interagido positivamente, procurando alguma espécie de entendimento que lhes tenha permitido coexistir. Esta nova teoria é apoiada pelo facto de os Neandertais serem uma espécie mais forte e resistente fisicamente do que os Homo Sapiens, além de estarem no seu próprio território, o que lhes traria vantagens sobre os seus eventuais oponentes. Além disso, à medida que mais artefactos e armas Neandertais foram sendo encontrados, concluiu-se que os Neandertais não eram tão elementares no seu pensamento e afinal possuíam algum tipo de raciocínio lógico e simbólico, pois só assim seria possível que criassem algumas das armas que utilizavam. As suas armas de pedra eram tão complexas e minuciosas na sua execução que implicavam uma noção do objetivo final e da consequência de cada ato, não sendo compatíveis com o estereótipo de Neandertal. Começou igualmente a admitir-se que, ao contrário do que se acreditava até aí, os Neandertais usavam pigmentos para pintar o rosto antes de saírem para a caça e que anteriores provas de canibalismo poderiam afinal ser evidências de que levavam a cabo rituais fúnebres.
© Comparação de esqueleto de Homo Sapiens e Neandertal (Wikicommons, Wapondaponda)
© Neandertal (Wikicommons, Hermann Schaaffhausen)
No que respeita à sua fisionomia, esta diferia muito da imagem que Boule criou. De momento, defende-se que um Neandertal passaria despercebido no metro de Nova Iorque, se vestido normalmente. A experiência foi efetivamente realizada, com um homem caraterizado como Neandertal e vestido com roupas comuns, e foi totalmente bem-sucedida: ninguém o notou como diferente no meio da diversidade de Nova Iorque.
© Esqueleto de criança Neandertal (Wikicommons)
Todavia, faltava ainda uma reviravolta na História. Após a descoberta reveladora de um esqueleto de criança moderna com características marcadamente Neandertais, o paleoantropólogo Erik Trinkaus atreveu-se a sugerir que, tal como em situações de guerra na atualidade os seres humanos procriam com a fração inimiga, também naquela época os Homo Sapiens procriaram com os Neandertais, criando híbridos. Ora, esta teoria não é tão simplesmente aceite pela ciência devido à sua complexidade e aos diversos fatores que podem determinar a sua impossibilidade. Não se tratava de raças ou ideologias diferentes, mas de espécies distintas, o que poderia impedir a procriação. Seria possível que ambos se tivessem relacionado sexualmente - mas seria também fisicamente possível que os híbridos resultantes dessas relações chegassem sequer a nascer? Existem casos de misturas de espécies bem sucedidas no mundo animal, mas em relação aos híbridos entre homens modernos e Neandertais não existe consenso científico. Trinkaus estudou posteriormente vários outros esqueletos e encontrou traços híbridos em todos eles, mas há antropólogos que afirmam tratar-se de uma má interpretação dos factos, mantendo-se reticentes em aceitar esta nova teoria.
Sem dúvida que uma prova indiscutível seria um teste de ADN que permitisse verificar se parte do nosso código genético é ou não proveniente dos Neandertais. Devido aos milhares de anos dos esqueletos e às condições em que foram preservados pelo tempo, foi difícil encontrar ADN em boas condições para que pudesse ser analisado. Contudo, ossos da Caverna Vindija, na Croácia, vieram renovar a esperança da comunidade científica, pois pareciam ter ADN em quantidade e qualidade suficientes. Estes e muitos outros ossos de Neandertais e de homens modernos foram analisados e a conclusão atual é de que, embora possam ter existido híbridos, a maior parte da evolução humana deu-se pela substituição dos Neandertais e, a ter havido traços de ADN neandertal nos homens modernos, estes foram perdidos com o tempo e a evolução.
© Extração de ADN de Neandertal (Wikicommons, Max Planck Institute for Evolutionary Anthropology)
Então, seremos nós descendentes dos Neandertais? Parece que não é provável, mas podemos pelo menos mudar drasticamente a nossa imagem mental dos Neandertais.
© Reconstrução de cenário (Wikicommons, Centro Courrier Annecy, Christophe Cagé)
© Ilustração de cenário (Wikicommons)
© Reconstrução de cenário (Wikicommons, Modzzak)
© Reconstrução de cenário de celebrações fúnebres (Wikicommons, Frank Vincentz)
© Esquiço de constituição de crâneo neandertal. (Wikicommons)
© Crâneo neandertal. (Wikicommons, Veronique Pagier)
fonte: Obvious
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