As últimas descobertas sobre os instrumentos construídos pelo corvo-da-nova-caledónia ajudam a explicar a evolução tecnológica do Homem, que inventou os anzóis de pesca há apenas 23 mil anos
Já se sabia que os corvos-da-nova-caledónia faziam ferramentas para conseguirem apanhar larvas nos buracos de árvores. O que um grupo de investigadores agora descobriu é o grau de benefício que tais "armas de caça" dão aos animais: uma destas aves apanha comida dez vezes mais depressa com um gancho que fabricou a partir de material encontrado na natureza (habitualmente ramos ou folhas) do que com um simples pau liso, sem anzol na ponta.
Essa vantagem mostrou-se decisiva na evolução destas técnicas e, até, um elemento diferenciador na seleção natural, conclui-se no estudo, publicado na revista científica Nature Ecology and Evolution (do grupo da Nature): "A velocidade de ingestão de comida é um determinante fundamental da aptidão darwiniana e, portanto, está sujeita a uma seleção intensa. Dados os modestos custos de fabrico de ferramentas com gancho (um corvo pode fabricar uma em menos de dois minutos, e depois transporta-a consigo, armazena-a e reutiliza-a), a taxa de aquisição de energia alcançada com este tipo de ferramentas deve proporcionar vantagens físicas substanciais aos seus utilizadores, aumentando a sobrevivência, o sucesso reprodutivo, ou ambos. A seleção natural deve, portanto, favorecer características que sustentam o fabrico desse tipo de ferramenta mais complexa."
Utensílios usados pelo corvo-da-nova-caledónia
Os investigadores estão convencidos de que o estudo ajuda a explicar como surge uma nova tecnologia no mundo animal e por que razão essa tecnologia evolui. E pode servir para justificar a evolução das invenções humanas. "A criação de anzóis é incrivelmente recente: aconteceu há apenas mil gerações, o que é um piscar de olho em termos evolutivos", disse Christian Rutz, autor principal do estudo, à BBC. "Quando pensamos que em mil gerações passámos da invenção dos anzóis para a construção de vaivéns... Isso é absolutamente extraordinário."
E, da mesma forma que o Homem não parou nos anzóis, o corvo-da-nova-caledónia (endémico da Nova Caledónia, um arquipélago do Pacífico, a 1500 quilómetros da Austrália) deverá continuar a evoluir, prevê Rutz. "Esta espécie vai inventar ferramentas melhores."
O corvo-da-nova-caledónia é um animal extremamente inteligente, como aliás são os corvídeos em geral. Consegue, por exemplo, usar o reflexo de espelhos para encontrar comida (embora, ao contrários de outros membros da sua família, não se reconheça no espelho). E, apesar de estar no topo da cadeia dos animais que conseguem utilizar ferramentas, não é o único. Muitos mamíferos e aves usam pedras para partir ovos, conchas e frutos secos, por exemplo. Alguns primatas conseguem mesmo aperfeiçoar folhas e ramos de forma a torná-los mais eficientes para recolher insetos ou para caçar (aguçando paus, para servirem de lanças). Nenhum, no entanto, é capaz de fabricar um instrumento tão complexo como um gancho.
UM CORVO A FABRICAR UM GANCHO
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