domingo, 19 de setembro de 2010

Titanic Expedition. Autopsiar um navio sob as ordens do capitão Vieira


Titanic

Expedição norte-americana ao Titanic vai criar o primeiro mapa arqueológico do local do naufrágio. O capitão é português.

A história de um dos navios mais famosos do mundo e o filme "Titanic" de James Cameron foram pouco para o capitão José Paulo Vieira. "Não pude recusar. Haver um português na história de uma expedição como esta era uma oportunidade única. Não podia deixar passar", conta.

José Paulo fala ao i, por telefone, com a excitação de um miúdo, apesar das barbas brancas: está no barco, ao leme do navio Jean Charcot, que durante quase um mês serviu de casa a uma equipa de 30 especialistas - entre arqueólogos, cientistas e historiadores - e de 17 membros da tripulação. Razão? Uma expedição ao navio Titanic, naufragado em 1912, numa altura em que se comemoram os 25 anos da descoberta dos primeiros vestígios do barco. "O estado de conservação do navio vai-se degradando. A expedição quer preservar a imagem do Titanic captando imagens a três dimensões e, ao mesmo tempo, tentar reconstruir a história e descobrir tudo sobre o naufrágio", explica ao i José Paulo Vieira, capitão do navio.

"Esta expedição começou a ser planeada em 2009. Queríamos encontrar uma forma de criar virtualmente o navio e preservar o seu legado intemporalmente. E perceber a taxa de biodeterioração, determinando o tempo que nos resta até o Titanic colapsar", explica Chris Davino, CEO da Premier Exhibitions e presidente da RMS Titanic Inc. (detentora dos direitos de exploração). Os altos custos do projecto serão compensados com a realização da Expedition Titanic 2010, uma exposição que pertence à Premier Exibitions (que organizou as mostras mundiais "Bodies", com partes do corpo humano, e que já esteve em Portugal, ou da "Dialog in the Dark", uma experiência de cegueira para pessoas que conseguem ver).

Começar pela ideia 

Os olhos da equipa de cientistas ficam no navio, mas as "mãos" que vão para o terreno são electrónicas: recorrendo a tecnologia de ponta, um robô e dois submarinos não tripulados (ver caixa) são responsáveis pela captação de imagens, vídeo e pela observação e análise do fundo do mar. José Paulo Vieira esclarece: "É como uma autópsia para descobrir as razões fundamentais do naufrágio. E ao mesmo tempo uma eternização da história, para que os vestígios possam conservar-se."

A ideia de partida, conta Paul-Henry Nargeolet ("PH"), líder da expedição, era fazer um documentário e recuperar objectos que servissem de prova. Mas o passar dos anos trouxe a recolha de muitos objectos e exposições no mundo inteiro. Hoje mais de 20 milhões de pessoas já viram exposições com objectos do Titanic. "Decidimos agora tratar e proteger o património do Titanic como se faz com os locais arqueológicos. A ideia geral é recolher o máximo de informações possível, o que agora se faz rapidamente e com bastante precisão, através das imagens de alta resolução e a três dimensões." A expedição que terminou ontem custou entre 4 e 6 milhões de dólares, da contratação e manutenção do navio, à contratação de engenheiros subaquáticos, à compra do equipamento de pesquisa e às câmaras de vídeo de ponta disponíveis.

"O objectivo da expedição é puramente científico. Não recolhemos relíquias nem reconstruímos artefactos. Os dados vão servir para criar o primeiro mapa arqueológico do local do naufrágio e vamos usá-lo como guia para futuros trabalhos. O resultado final será um plano para melhor proteger e preservar a memória do navio", explica Chris Davino.

Margem mínima 

"Trabalhar a 3800 metros de profundidade é difícil, o mínimo erro torna-se rapidamente uma catástrofe", explica Paul-Henry Nargeolet. "PH" é um dos mais experientes a bordo do navio explorador: já fez 30 mergulhos num submergível no local onde foram encontrados os restos do Titanic, dispersos num perímetro de 4,5 quilómetros.

A expedição começou a 23 de Agosto, com a partida de St. John''s, na Terra Nova, Canadá, um porto com forte tradição portuguesa. A viagem devia terminar hoje, dia 18, mas o navio chegou ao porto de St. John''s ainda ontem: o mau tempo e a aproximação de um furacão ditaram o regresso anterior ao previsto.

"Trabalhar no oceano não tem nada de rotineiro. Temos uma equipa muito talentosa e que se adapta aos desafios. Um dos maiores nesta expedição foram as condições meteorológicas. Tivemos de parar as operações porque houve dois furacões muito fortes e uma terceira ameaça no final da expedição. Usámos esses acontecimentos como lições para empreender novas operações em águas profundas." Além das memórias da viagem, há mais um acontecimento inesquecível para o capitão português: José Paulo Vieira casou Maryann Keith e Evan Kovacs, dois cientistas da equipa de investigação. A cerimónia foi no convés do navio. A história fica, mais uma vez, guardada no mar.

fonte: Jornal i

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