sexta-feira, 16 de julho de 2010

Chegou o mosquito à prova de malária



Mosquito da Malária

Mosquito transgénico pode ser a chave da erradicação da malária. Aplicação ainda é ficção científica, diz especialista portuguesa.

Fevereiro de 2009, conferências TED na Califórnia. Nos seus 18 minutos de palco, Bill Gates resolve pregar uma partida: "A malária é transmitida por mosquitos. Tenho alguns aqui." Abre um frasco cheio deles. "Não há razão para serem só os pobres a ter esta experiência", continua o fundador da Microsoft, que nos últimos anos investiu mais de 200 milhões de euros no combate à doença. O público ri, os comentários nas redes sociais disparam. "Os mosquitos não estão infectados", esclarece Gates, depois de deixar passar alguns segundos. A ideia era tornar o assunto motivo de conversa, porque é também assim que se angariam fundos. Hoje Gates teria pano para mangas: os cientistas norte-americanos criaram em laboratório o primeiro mosquito à prova de malária. A descoberta era esperada há pelo menos uma década, quando começaram os primeiros trabalhos para manipular geneticamente as espécies de mosquitos responsáveis por transmitir o parasita que todos os anos mata um milhão de pessoas.

O avanço científico, divulgado na revista científica "PLoS Pathogens", nasceu num laboratório de entomólogos da Universidade do Arizona. Foram usados mosquitos da espécie Anopheles stephensi, o principal vector de malária no subcontinente indiano, para fazer experiências de manipulação genética. O resultado chegou quando se decidiu alterar uma molécula relacionada com o metabolismo do insecto, a enzima Akt, de forma a potenciar a sua resposta imunitária à infecção: ao alimentar as fêmeas com sangue de animais infectados, em vez de uma maior ou menor resistência, nenhum insecto foi infectado com Plasmodium. O êxito foi uma surpresa, garante um dos autores do trabalho, Michael Riehle. "Estávamos apenas à espera de ver algum efeito na taxa de crescimento dos mosquitos, na esperança da vida ou na susceptibilidade ao parasita. Foi óptimo perceber que a nossa alteração bloqueava por completo o processo de infecção."

Os mosquitos transgénicos estão para já num laboratório de segurança elevada à espera de novos planos, e também de legislação que permita uma verdadeira evolução da espécie, uma das apostas para a erradicação da malária.

"São muito boas notícias, mais um passo na direcção certa", diz ao i Maria Mota, especialista em malária do Instituto de Medicina Molecular em Lisboa. "A ideia seria lançar os mosquitos no terreno, em número suficiente e com alguma vantagem reprodutiva sobre os outros, para que com o tempo esta nova população substituísse a existente. Claro que isto por agora é mesmo apenas ficção científica... e será sempre a parte mais difícil de atingir." A pergunta que é preciso fazer, sustenta Riehle, é "o que podemos fazer para tornar um vector bom um vector mau? Este cenário de erradicação envolve três requisitos: um gene que interrompa o desenvolvimento do parasita dentro do mosquito, uma técnica genética que introduza esse gene no genoma do mosquito e um mecanismo que dê ao mosquito modificado vantagem sobre as populações naturais".

Para Maria Mota, o mais difícil "será encontrar formas de tornar estes mosquitos de laboratório mais preparados e capazes de sobreviver no terreno, e de forma mais predominante. E isto até agora ninguém conseguiu fazer". Mas há outros problemas: as incertezas científicas, mas também da opinião pública, em relação aos organismos modificados, diz a investigadora. "Será que há outras alterações? Será que altera a transmissão de outros patogénios? Será que aumenta a transmissão de outros organismos? São mais as perguntas que as respostas."

fonte: Jornal i

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